Resumo:
Este artigo
aborda a leitura, como motivação ao crescimento
intelectual,
considerando a vida da criança na família e na
escola até
o seu desenvolvimento crítico. A responsabilidade de pais e
professores
é essencial nesse processo de leitura.
Palavras-chave:
Leitura;
Leitura - motivação; Leitor crítico.
Ler. Eis aí um ato repleto de inúmeras
implicações,
conseqüências, e dependendo de cada um que
lê, de motivações.
Sim, motivações, pois até pegar um
jornal diário
e dar uma passada rápida com os olhos pelas manchetes requer
algum
interesse por trás deste simples folhear despreocupado de
páginas.
Cada leitor busca algo que lhe sacie o desejo por conhecimento ou
apenas
por lazer e este objeto desejado muitas vezes torna-se obscuro, de
difícil
acesso, já que nem sempre se pode incluir no dia-a-dia a
leitura.
Quando não é elitizada a
informação, seja por
desigualdade social, seja por preconceito, ela pode estar
negligenciada,
relegada a segundo plano, aos setores da sociedade realmente
interessados,
à vida acadêmica, aos privilegiados.
Porém o que será
tratado aqui mais especificamente, será o porquê
da leitura
não estar entre os principais interesses de tantas pessoas e
como
motivar este batalhão de quase excluídos. Quase,
pois essas
pessoas é que pensam não gostar de ler. Ledo
engano. Elas
foram adestradas durante anos, a começar desde a mais tenra
idade,
a não apreciarem um livro. Não sabem que
não tiveram
opção de escolha, já foi escolhido
para elas não
gostarem e pronto.
Tudo começa no seio familiar; todos os principais exemplos
de conduta
que serão levados pela vida toda estiveram ali durante
rápidos
e decisivos anos como em uma exposição de fatos,
princípios,
comportamentos. É neste ambiente propício para a
construção
da personalidade que se marca indelevelmente as vontades e os anseios,
os desejos e as motivações.
Como uma esponja insaciável e curiosa, esse pequeno aprendiz
age,
urge por interação com tudo e todos a fim de
reter a maior
quantidade possível de informações,
conhecimentos,
experiências. Se não for alimentado, essa gana por
novidades
poderá, com o tempo, distanciar-se do caminho que leva
à
leitura, o hábito prosaico e deleitoso de ler quer seja um
simples
gibi, quer seja Camões. O tempo trata de rapidamente
apresentar
trilhas muito mais fáceis de serem percorridas, pois algumas
dessas
trilhas não necessitam de guia ou setas, apenas da
atenção
alheia. A televisão é uma delas, certamente.
Requer pouquíssima
concentração, nenhuma aptidão,
qualquer vontade que
seja. Pronto, perdeu-se outro leitor e agora o que se faz? Motiva-se
apresentando
outras fontes de prazer, talvez reapresentando o ato de ler como um ato
natural, sem dor alguma, ao contrário do que tantos denotam
erroneamente.
Conforme Yunes (1984, p. 53)
O
estímulo
sistemático à leitura deveria
ser
meta prioritária em
países em
via de desenvolvimento.
Constata-se no
Brasil que o hábito
de ler não
representa uma
tradição e, por
isso,
a motivação
através de técnicas
específicas deve ser encarada como um
campo de estudo
e pesquisa de novas modalidades que visem à
aproximação
do livro com o leitor.
Já Sandroni (1986 apud BORTOLOM et al, p. 11) afirma que
“para ler
é preciso gostar de ler.” Óbvio que
quando não é
fomentada esta prática ou qualquer outra que seja, quando
não
há exemplos vindos dos principais parâmetros
referenciais,
no caso aqui o lar familiar e a escola, raramente tem-se um leitor
assíduo
e interessado em conhecimento. Raríssimas são as
exceções.
Adultos que jamais lêem um livro, que passam tempo demais
frente
à teve, que pouco discutem assuntos de ordem geral e
polêmicos.
E o sistema escolar há muito tem parcela de culpa neste
panorama.
Como denotou Freire (1988 apud GADOTTI, 1996), é grande a
distância
entre o que é lido nas escolas e o mundo das
experiências
pessoais, o mundo em que todos vivem suas vidas, com
experiências
personalíssimas. Ao estudante, resta a
obrigação
de ler calhamaços, ou melhor, decorar mera e simplesmente. A
vontade
pessoal, os gostos de cada um pouco importa. Claro que está
mudando
esse quadro, apesar da lentidão e dos sempre escusos
interesses
de quem não deseja ver um Brasil de cidadãos
opinativos e
críticos.
Então, como existir leitores de opiniões
próprias
se tantos nem gostam de ler? Claro que fica muito mais
difícil iniciar-se
a inserção de uma pessoa depois de adulta ao
mundo das letras
do que uma criança que já está por
natureza apta e
pronta para receber tantos ensinamentos e condicionamentos que
carregará
por toda a vida de forma natural. Enquanto houver alguém sem
ler,
ali estará um futuro leitor crítico, se for
incentivado.
Segundo Silva (1981, p. 45) é relevante “o fato da
leitura ligar-se
muito intimamente ao projeto educacional e à
própria existência
do indivíduo.” De fato, quanto mais a leitura
estiver fazendo parte
do cotidiano de cada um, haverá mais leitores realmente
conscientes
do que lêem, e para quê lêem. Leitores
afeitos ao prazer,
sempre em prontidão para conhecerem outros mundos, outras
idéias,
em benefício próprio.
É interessante instigar a criança à
ludicidade, à
curiosidade pela fantasia, por histórias, adaptadas ou
não,
tanto faz, o importante é contá-las ou
lê-las aos filhos.
Casos ocorridos, lembranças de vida,
“causos” passados de geração
a geração, tudo é válido. A
aquisição
rotineira de livros aos filhos prestando atenção
nas preferências
deles também conta, assim como levá-los
à bibliotecas
e livrarias, inserindo no dia-a-dia da família este
hábito
salutar, uma vez que o contato com este mundo somente
ajudará e
muito para os costumes familiares caminharem em
direção ao
conhecimento. É crucial saber que a criança deve
ter as escolhas
próprias respeitadas. Com o gerenciamento dos pais
obviamente.
A partir do que Silva (1981, p. 42) escreveu quando diz que
“leitura é
uma atividade essencial a qualquer área do conhecimento e
mais essencial
ainda à própria vida do Ser Humano”,
nota-se a importância
ao hábito de ler sem restrições.
Impossível
censurar alguém por ler. Talvez mostrar outros prazeres da
vida,
como viver em meio à natureza, fazer amizades, amar,
praticar esportes,
etc. Mas jamais censurar. O oposto a isso é que deve ser
seguido
por todos. Motivar sempre à leitura, mostrar o tal caminho
das pedras.
E para isso, os primeiros anos de vida valem ouro quase literalmente. O
ambiente familiar exerce influência primordial na
construção
do futuro leitor.
O exemplo que a criança tem em casa é o mais
valioso, por
isso quando ela vê os pais em diversas oportunidades
“agarrados”
a livros ou mesmo periódicos, terá maior
facilidade a valorizar
tal ato instintivamente (SANDRONI, L. C.; MACHADO L. R., 1987).
Para os bem pequeninos são recomendadas as
histórias mais
curtas e rápidas, de linguagem bem simples, com muitas
ilustrações
que denotam movimento e reforçam a história.
Deve-se ler
para eles em voz alta, podendo-se interpretá-las
encenando-as junto
à leitura. Isso fará a criança
interessar-se em aprofundar-se
neste mundo mágico, desejar mais e mais, até
chegar o momento
dela própria buscar histórias que lhe interessam.
Para os já em processo de
alfabetização, livros de
fácil leitura, com histórias curtas impressas em
letras grandes,
de frases curtas, ou aqueles que brincam com as formas da palavra.
Importante sempre dar vazão à fantasia e mostrar
às
crianças nesta idade contos e histórias que
não dêem
relevância excessiva à moral, assim como
à lógica
exacerbada e como denota Sandroni (1987, p. 19), “os pais
devem entrar
no jogo [...]; pais e filhos juntos procurarem juntos as respostas,
consultando
livros.” Os livros devem ficar num lugar da casa de acesso
fácil.
Entretanto, há crianças que não gostam
de ler e impõem
obstáculos à prática da leitura.
É necessário
não se preocupar em demasia, nem pressionar. Com
paciência
haverá livros para serem encontrados que vão ao
encontro
dos interesses da criança. Mesmo que sejam gibis ou tiras
dos quadrinhos
de jornal, não importa, tudo o que leva ao hábito
de ler
desde cedo deve ser encarado com naturalidade e jamais com reservas,
pois
com o tempo esse iniciante leitor passará a desejar mais e
novos
rumos, o que o fará crescer intelectualmente.
A escola é por um bom tempo na vida do Ser Humano o segundo
lar
e a segunda família. Nada mais natural então, que
os pais
tenham contato estreito e sincero com professores, já que
desta
união quem ganha certamente é a
criança que será
motivada com maior conhecimento de causa tanto em casa como no ambiente
escolar. Motivações que precisam ser para
qualquer momento
propício à leitura (SOUZA, 1986). Essas
motivações
devem ser observadas inerentemente à faixa etária
do aluno,
pois todos eles necessitam estar sempre em constante interesse pela
leitura.
A escola integrada à vida do aluno, tendo diversos fatores
em comum
ao cotidiano é ponto crucial. Uma escola desligada do que
ocorre
no “mundo de fora”, dos anseios e
aflições características
dessas fases da vida (principalmente a adolescente), até
mesmo dos
modismos culturais, corre seriamente o risco de ficar para
trás,
ultrapassada, e pior, de fomentar inúmeros inimigos da
leitura.
Por isso discutir assuntos de toda ordem, falar sobre o que os alunos
gostam,
não como uma concessão, mas como um atrativo
sedutor a mais
no processo todo, irá fazer com que eles desejem outros
temas, outros
livros, por histórias que os levem por trilhas desconhecidas.
Como escreveu Souza (1986, p. 41), é preciso
“angariar a simpatia
do aluno, oferecendo-lhe oportunidade de resgate de
experiências
pessoais [...] em sintonia com as experiências do
texto.” E quando
o aluno ansiar por leituras além daquelas oferecidas pelos
professores,
que ela surja sem condicionamentos, enfim, quando e onde ele bem
desejar,
livremente.
Ler deve ser prazeroso. É base para uma vida toda,
ferramenta para
enfrentar os desmazelos da sociedade e a escola exerce fator
importantíssimo
no que se refere a esta construção do Ser Humano
consciente
do que o rodeia. Segundo Bortolom et al. (1998, p. 118) “no
Brasil a escola
talvez seja o único lugar onde a grande maioria das pessoas
tem
contato com o livro.”
Partindo desse pressuposto, tem-se a relevância da escola,
que não
substituirá jamais os pais no que lhes competem, mas auxilia
sem
restrições os futuros adultos às
múltiplas
visões acerca do universo que vivem, uma vez que leitura
não
está ligada apenas a textos, mas também a
acontecimentos
variados, às diversas mídias existentes e
continuamente em
expansão, às entrelinhas dos fatos que se sucedem
perante
os olhos de cada um e que muitas vezes não são
realmente
aquilo que aparentemente parecem ser.
Escreve-se para alguém normalmente. Não sendo
assim é
apenas terapia pessoal ou um passatempo sem maiores
implicações
ou conseqüências aparentes. E quando é
criado um texto,
daquele instante em diante aquelas linhas serão do mundo, de
todos,
e a cada um que lê cabe intrinsecamente a
transformação
da lógica, do conteúdo, da razão de
ser da obra em
si. Conhecendo e aprendendo, o indivíduo através
da decifração
da escrita amplia horizontes consideravelmente, assim como adiciona
possibilidades
a um texto.
Esse ato descrito acima não é nenhum
demérito a um
escritor ou jornalista, pelo contrário, é a prova
de que
tais escritos levaram a discussões e a outras
interpretações,
enfim, o que se propõe é uma leitura
crítica e consciente,
nunca passiva.
Na visão de Tufano (198? apud Bortolom et al) “um
texto não
traz, declarado, o seu sentido; é o leitor, que no
diálogo
com a linguagem passa a atribuir significados [...]. Nesse sentido
crítico,
não podemos ler pelos outros [...]; o ato de ler
é solitário
[...]. Não há leitura autêntica sem a
marca do leitor.”
O leitor torna-se seletivo, escolhe, decide o que lhe é
útil.
O processo de caminho à criticidade inicia-se em casa e
é
levado adiante na escola (claro, nas escolas que se doam a tal
método
instigante e essencial ao crescimento intelectual do Ser Humano). No
lar
têm-se, principalmente, os exemplos dos pais, no cotidiano,
em momentos
sem maior importância inclusive, pois uma criança
que cresce
vendo-os sempre entregues à leitura (independentemente do
que se
está lendo) terá chances maiores de que no seu
próprio
cotidiano seja formado por toda a vida o hábito de ler.
E ler é ferramenta primordial para que o Ser Humano saiba
posicionar-se,
ter opiniões próprias, ser crítico,
conforme tantos
autores já louvaram. Pena que a grande maioria das escolas
brasileiras
de ensinos fundamental e médio não
exerça essa prática
com afinco, trilhe o caminho mais fácil,
burocrático e desestimulante.
O contrário é dispor e usar do recurso que a
leitura revela
a fim de ter-se armas na luta contra a alienação
e a massificação.
Isso significa lutar em prol de cidadãos originais e
autênticos,
que concebam suas próprias linhas de raciocínio,
seus próprios
pensamentos, que sejam únicos, por mera e simplesmente obra
do conhecimento
adquirido. E ter tal atitude torna-se então necessidade
desses seres
que aprendem e buscam, contestam e provam o sabor da
independência.
Sim, essa talvez seja a palavra-chave: independência.
Comunicação, apreensão,
fixação, compreensão,
transformação. No momento da leitura o leitor
está
senhor de si e de suas decisões. Como que em conflito com o
texto,
o transforma em algo familiar, algo seu. Conforme Silva (198l, p. 45)
“ler
é [...] um modo de existir no qual o indivíduo
compreende
e interpreta a expressão registrada pela escrita e passa a
compreender-se
no mundo.”
Domínio da linguagem, dos conceitos abstratos, das palavras
não
usuais, eis um desafio hercúleo para pais e mestres,
porém
os frutos a colher são os mais saborosos, são
aqueles que
se degusta com deleite e regozijo, e cidadãos formados em
consciência
crítica o são frutos especiais, de raro prazer
para quem
planta sementinhas de saber, rega com carinho e esmero sabendo que
aqueles
frutos herdarão liberdade plena.
Tomada de consciência que impreterivelmente gera
criação,
novidades. O leitor parte para a criação, seu
próprio
texto e segundo Silva (1981, p. 81) “a leitura
crítica deve ser
caracterizada como um projeto, pois se concretiza numa proposta pensada
pelo ser-no-mundo, dirigido ao outro”.
Enfim, ler liberta, impulsiona as possibilidades de conhecimento a
níveis
inimagináveis, transforma a consciência do Ser
Humano perante
o mundo em que vive, dota o leitor a ser capaz de abrir
inúmeras
portas do desconhecido, instiga ao infinito.
BORTOLOM,
M.A. et al.
Levantamento das características culturais no
hábito de leitura
da comunidade acadêmica do Curso de Biblioteconomia da
Universidade
Federal de Santa Catarina. Revista ACB, Florianópolis, v. 3,
n.
3, p. 113-123.
FREIRE,
P. Ler palavras,
ler o mundo. In: GADOTTI, M. (Org.). Paulo Freire: uma bibliografia.
São
Paulo: Cortez, 1996, p. 453.
SANDRONI,
L. C.; MACHADO,
L. R. Ler em casa. In:_____. A criança e o livro. 2. ed.
São
Paulo: Ática, 1987, p. 18-21.
SANDRONI,
L. C.; MACHADO,
L. R. A importância da imagem dos livros. In:_____. A
criança
e o livro. 2. ed. São Paulo: Ática, 1987, p.
42-43.
SILVA,
E. T. da. Ler é,
antes de tudo, compreender. In:_____. O ato de ler: fundamentos
psicológicos
para uma nova pedagogia da leitura. São Paulo: Cortez, 1981,
p.
42-45.
SILVA,
E. T. da. Leitura
crítica – explicitação.
In:_____. O ato de ler: fundamentos
psicológicos para uma nova pedagogia da leitura.
São Paulo:
Cortez, 1981, p. 78-81.
SOUZA,
M. S. D. de. O interesse
pela leitura poderá surgir. A conquista do jovem leitor.
Florianópolis:
EDUFSC, 1986, p. 39-41.
YUNES,
E. A leitura e a
formação do leitor: questões culturais
e pedagógicas.
Rio de Janeiro: Antares, 1984, p. 53.
______
Keywords:
Reading;
Reading motivations; Critical reader.
______